Tenho
saudades de um burro que passava bem cedo na minha rua, arrastando
ronceiramente uma carroça, velha como ele, o burro.
Se
o dono tivesse acompanhado o progresso, por certo a carroça teria rodas com
amortecedores e pneumáticos; como não tinha, acordava-me com um barulho sem
melodia, começava algures, vinha de longe, e ia chegando perto, mais perto,
sempre mais perto.
Saint-Exupéry,
no "Principezinho", imagina a felicidade da raposa, ansiosa pela
chegada das horas:
-"... Por
exemplo, se vieres às quatro horas, às três, já eu começo a estar feliz. E
quanto mais perto for da hora, mais feliz me sinto...".
A
melhor das minhas vontades seria sempre pouca para alcançar a felicidade da
raposa. Ou talvez sim, depois do burro, arrastando ronceiramente uma carroça,
velha como ele, estrada fora, se perder no silêncio: um pouco mais longe, mais
longe, sempre mais longe…
Na
minha rua, o vento, quando vem, sopra de modo diferente nas
"portadas" das janelas, e a chuva, quando chega suave, parece
acariciar os cocurutos das árvores. O sol, se acordar sorridente pela manhã, em
silêncio beija-me o rosto.
O
burro morreu, o silêncio não…
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